BIOGRAFIA
Nasceu em Jardim do Seridó, no dia 13 de junho de 1887. Filho de Horácio Olímpio de Oliveira Azevedo e Marcionila Cavalcanti de Azevedo.
Foi alfabetizado pelo pai e o primo Felinto Ideofonso de O. Azevedo. Estudou com o professor paraibano João de Souza Falcão. Casado com Alice Cunha de Azevedo, filha do Cel. Felinto Ellísio e de Neomízia Amélia Cunha de Azevedo.
Pertenceu ao Instituto Histórico (nº339) e Geográfico do Rio Grande do Norte e também Paraibano, a Academia Potiguar de Letras, a Academia, com 82 anos, Norte-Riograndense de letras e à Academia de Trovas do RGN (tem como patrono Laurentino Bezerra).
Trabalhou como agente de Rendas Federais, adjunto (assessor) do Promotor Público e suplente do procurador da República, as de Tabelião de notas e Escrivão Judicial, durante 19 anos em jardim do seridó.
Por volta de 1937, foi removido pra Natal, exercendo atividade no 4º Cartório, chegando a se aposentar. Foi eleito “Prefeito Constitucional do Município” e, 1952. E em 1954 afasta-se do cargo e assumi o Vice, Manoel Paulino dos S. filho.
Faleceu em 1975, no dia 5 de novembro, sendo sepultado em Natal com 88 anos.
Os filhos: Alínio Cunha de Azevedo (tabelião)
Max Cunha de Azevedo (cirurgião-dentista)
Ednah Cunha de Azevedo (professora)
O livro “Zelações” foi publicado pelo departamento de Imprensa do Estado, com Prefácio do escritor Luiz da Câmara Cascudo – 1º volume (1955).
Em 1963 publicou o 2º volume de versos, o livro “Pirilampos”. Recebeu elogios da crítica especializada.
Colaborou em diversos jornais e revistas do Estado e do país, escrevendo em prosa e verso.
Pertenceu ainda, ao Clube de Poesia de Natal, ao Teatro de Amadores de Natal, à União Brasileira de Escritores, na seção do Estado e à Academia DIOCÉSIA.
Em suas plaquetas, fez estudo sobre Olavo Bilac.
Há de inéditos: “Cartas ao Malaquias”, mensagens Humorísticas, em versos; “Crônicas Esparsas”, Artigos de jornal; “Orações”, discursos e palestras; “Borboletas”, Trovas.
A.A. fazia leituras de poesias dos grandes poetas Guerra Finaqueiro, Júlio Dantas e dos Brasileiros: Olavo Bilac, Guimarães Rosa, Emílio de Menezes, Alphonsus de Guimarães, Arthur de Azevedo (parente).
Emílio de Menezes Tinha o pseudônimo de Cabugi Pitanga (escrevia poesias pra uma revista Carioca “O Malho”).
A.A. enviou o soneto “Joazeiro”, assim que teve noção das regras das métricas pra a revista carioca “O Malho”.
Colaborou para muitas revistas, almanaque e jornais do Brasil, Portugal e do Estado, notadamente na “Vida Doméstica”, (RJ); “A Cooperação”, “Jornal de Felgueiras” (Portugal); Almanaque de Bonito (PE); “A União”, “Correio da Paraíba”, “Era Nova”, Manaíra” e “Tambaú” (J. Pessoa); “O diário”, “A República”, “Folha da Tarde”, “Milho Verde” e “Nordeste Magazine” (Natal); “Correio do Seridó”, “O Seridoense” e “A Folha” de Caicó, e “Voz do Seridó” (Currais Novos).
Em Jardim do Seridó fundou e dirigiu o jornal “O Município” com Herácio Pires.
Fundou e dirigiu o “Jornal da Festa” em parceria com Silvino Pires. Circulava durante o novenário da Padroeira.
Fundou e dirigiu o jornal “O Parafuso” (humorístico) como anônimo, constava de piadas e brincadeiras.
Como prefeito deu prioridade à agricultura; a conservação das estradas e açudes; mata-burros; deu assistência à cooperativa local, proporcionado funcionamento aos pequenos agricultores.
Em 11 de outubro de 1955 renunciou o cargo de prefeito.
No poema “Homenagem a Jardim”, A.A. faz referências a cidade Jardim do Seridó como uma cidade bela, cheia de encantos, paz, amor e demonstra seu sentimento de liberdade através da cidade que nasceu.
No poema “Minha Terra”, A.A. Enfatiza o povo jardinense, diz ter descendência de portugueses que fundaram a fazenda Conceição e fogo, a famosa Jardim do Seridó, como a mais bonita do sertão.
ALGUNS SONETOS
OS RETIRANTES
Antídio de Azevedo
Tristonhos, a sofrer a cruel impiedade
Do sol ardente, qual rubra fogueira acesa,
Se vão em caravana e sempre na incerteza,
Dê que ampará-los venha a mão da Caridade!
Despidos de ilusão, na dura realidade
Da vida, a palmilhar, cintados, a aspereza
Dos campos nus, sofrendo o agror da Natureza,
Vão êles a fugir do lar que a fome invade!
E pela estrada assim, pisando sôbre abrolhos,
Enquanto se arrojado, inquieta, dos seus olhos,
As lágrimas se vão – num desfilar eterno –
Recordam, com saudade, o tempo em que nos ninhos,
Ouvia-se o cantar feliz dos passarinhos,
Nas matas do Sertão – no adeus claro do Inverno!
A Folha. Ano III – Caicó, RN – 07/julho/1956 – Nº123, pág. 04
COQEIRO
Ereto e solitário, em meio das areias,
Ergue-se, como um rei, avançando aos espaços.
Ao escutar, alta noite, o canto das sereias,
Sossega, como que morrendo de cansaços...
Parecendo ter sangue azul nas suas veias,
E, como nós, ter alma, estende os longos braços,
Qual humano, implorando às praieiras tão cheias
De graça singular, seus carinhos e abraços.
Quando, à tarde, recebe o farfalhar dos ventos,
Alegre e ufano canta e, às vêzes, tem lamentos...
Parece, como nós, sentir e ter amores...
Demonstra na alma ter paixão bem infinita
Por alguma morena, amável e bonita,
Que passeia na praia, alheia às suas dores...
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 18/fevereiro/1956 - Nº103, página 03
VELHAS QUIXABEIRAS
Antídio de Azevedo
Vi-as, outrora, ufanas e floridas,
Erguerem-se no meio da planura,
Ao passaredo cheio de ventura
Ofertando a mais dôce das guaridas.
E hoje vejo-as de fôlhas ressequidas,
Os galhos, em humilde curvatura,
Têm vivas aparências de tristura.
De pungentes angústias reprimidas.
E já não têm aquela afável coma,
Verde-escura, de tão divino aroma,
Nem têm de borboletas o alto cheio!
E já não têm aquêles trinos suaves,
Daqueles bandos de caronas aves,
Que cantavam, outrora, no seu seio!
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 18/12/1955 - Nº92, página 03
MINHAS ILUSÕES
Antídio de Azevedo
Qual um bando fugaz de passarinhos,
Uma após outra, todas têm partido!...
Quem há que, da sorte a colher espinhos,
Já não as tenha, assim, tôdas perdido?
Acolhi-as, um dia, com carinhos...
E aqui, dentro em meu peito, protegido
Êsse bando fugaz de canarinhos,
Algum tempo viveu, bem divertido.
Que pesar, quando as ví, em debandada,
A sulcar a amplitude constelada,
Em busca de outras plagas, de outro abrigo!...
E se, acaso, eu indago das estrêlas
Se apoderei ainda um dia tê-las,
Dizem: - “Não as terás jamais contigo!...”
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 17/12/1955 - Nº94, página 03
PEREGRINAÇÃO
Antídio de Azevedo
Peregrinando, andei por terras muito longe,
No labirinto azul, sem fim, da fantasia;
Auscultando a mi mesmo, à moda um velho monge,
No ânsia divinal da mais doce ambrosia...
Pobre de Amor, parti, impávido cantando,
Um mundo a procurar de mil constelações;
Mas, pela vida assim, debalde navegando,
Nadei, como um herói, no mar das ilusões!...
Sangrando os pés na estrada agreste do Destino,
Levava a transbordar o peito de Esperança...
Ao fim, porém, da senda, inane o peregrino,
Disiludido, diz ao coração: - Descança!...
Agora, ao regressar, cansado e sem tesouros,
Perdidos, um a um, os ricos Sonhos meus,
Repouso tive, enfim, da azáfama sem louros,
Na placidez do Céu azul dos olhos teus!...
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 24/09/1955 - Nº95, página 03
AVE MARIA
Antídio de Azevedo
Desde a tarde, tristonha e calorenta.
O céu – um grande manto desmaiado...
Traspassa meu peito esta dor cruenta,
Tenho o meu coração dilacerado!...
Com um beijo de luz amarelenta,
À tôrre branca da capela dado,
O antro-rei, vagaroso, se aposenta,
Taciturno, qual monge torturado...
Lá na tôrre da igreja, lentamente.
O velho bronze, num gemer doente,
Por sua vez, propala o fim do dia.
A noite vem descendo, lenta e calma.
E outro sino que tenho dentro da alma,
Também vai badalando – Ave Maria!
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 19/09/1955 - Nº90, página 03
DIA DE FINADOS
Antídio de Azevedo
Finados! Dia triste! E, plagente, soluça
O velho bronze, ali, na tôrre adelgaçada!
A humanidade inteira agora se debruça,
Tristonha, a meditar no pélago do Nada!
Desnudo, êste sudário azul que a Terra cobre,
Desmaia e põe à mostra um aspecto funéreo...
E o sino da Matriz, naquêle mesmo dobre,
Nos convida a um dever: - rezar no cemitério...
Começa a romaria. Em meio à mutidão,
Compacta, a palmilhar agros caminhos tortos,
Deixando em cada passo arguto uma ilusão.
Eu vou também fazer uma visita aos mortos.
Chega o cortejo, enfim. Homens tristes, mulheres
E crianças vão caindo às campas ajoelhados...
Revela cada rosto – a fuga dos prazeres,
Implora cada prece – indulto dos pecados...
Aqui, é uma viúva, envolta em crepe, aflita,
Olhos fitos no chão, a face desbotada
Pela dor, comovida, assim a orar, contrita,
Pelo espôso que viu tombar da Vida ao Nada.
Ali, é uma donzela, ocultando o alvo rosto
Nas dobras leves duma echarpe energecida,
Pelo qual transparece a sombra dum desgôsto,
Rogando, atenta, a Deus, por uma irmã querida.
A Folha. Ano III, Caicó, RN – 03/11/1956 - Nº104, página 04
QUISERA!...
Antídio Azevedo
Quisera ter asas do Saber,
Brancas e puras, como a luz do dia,
Para num vôo ousado, percorrer
O belo Céu azul da Poesia!...
Quisera haurir, no templo do Prazer,
Eflúvios divinais da Fantasia...
E sem passar na terra do Sofrer,
Ir assim em pomposa romaria!...
Quisera, sem a pena dos proscritos,
Contemplar êsses Mundos infinitos,
Tão decantados na Sagrada História!
Quisera ver de perto o Sete-estrêlo,
Mira-lo, defini-lo, compreendê-lo,
Morrer subindo para o Céu da Glória!...
A Folha – Semanário noticioso e informativo. Ano II, Caicó, RN – 14/01/1956 – Nº98, página 03
A MORTE DA ROSA
Antídio Azevedo
Manhã fria de Junho. Em bátegas pesadas,
A chuva impertinente alaga o meu jardim,
E o vento, com furor, sem piedade e sem fim,
Sopra, como um tufão, em gélidas rajadas.
Pétalas pelo chão, duramente arrancadas...
- Um misto singular: veludo com cetim –
É doloroso ver a flor morrer assim,
Tão meiga, espedaçada ao sopro das lufadas!
Comente um crime atroz a própria Natureza:
Um tesouro de olor, de encanto e de beleza,
Rouba numa manhã tão fria e nebulosa!
Modulam, com pesar, o mais tristonho chôro,
No jambeiro vizinho, os pássaros em côro,
Cantando, com saudade, o funeral da rosa.
A Folha – Semanário noticioso e informativo. Ano II, Caicó, RN – 21/01/1956 – Nº99, página 03
FIM DO DIA
Antídio de Azevedo
A tarde é merencória e o azul do Céu desfeito
Num infinito manto espesso e pardacento;
Do velho Seridó no arisco e frio leito,
Desfere uma coruja o seu pio agourento.
Um sino lá na tôrre e um outro no meu peito,
Constantes em gemer – intérmino lamento!
Daqui do coração, ao dissabor afeito,
Eleva-se uma prece em cada pensamento...
O passaredo, em bando, a procurar repouso,
Vai, célere, buscando as palmas verdes escuras
Dos leques sem rivais do coqueiral choroso.
Como as aves também, regressa a multidão
De saudades, em bando, e negras amarguras,
Em busca de pousada, aqui no coração...
A Folha. Ano II, Caicó, RN – 04/02/1956 – Nº101, página 03
CÃO FELIZ
Bem cedo, pedestrando lentamente,
Descendo do Tirol para Ribeira,
Eu vi certa deidade, bem contente,
Debruçar-se à janela, bem faceira.
Mamilos quase nus, indiferente
A tudo, bela, ardente e tão matreira,
Acomodava ao seio arfante e quente,
Um cãozinho de crêspa cabeleira.
Como invejei a sorte do cãozinho,
O conforto de tão macio ninho,
Naquela manhã fria e nebulosa!...
Quem não desejaria ali pousar,
Aquecer-se, com os lábios afagar
Aqueles dois biquinhos cor de rosa?!
Antídio de AZEVEDO
PARABÉNS
Se um pombo-correio tivera
Para voar, cortando o espaço,
Mandar-lhe-ia, com meu abraço,
Lindo bouquet da primavera.
Como o pombo voar quisera,
Cruzando o céu, sem embaraço,
Para de rosas doar-lhe um maço,
No transcurso da feliz era.
Mas, se nessa oportunidade,
Encontro essa dificuldade
Desses meios assim diversos,
Quero levar-lhe, no momento,
Mas asas do meu pensamento,
Meus parabéns nestes meus versos.
Antídio de AZEVEDO.
Natal, 27 – 07 – 1962
REGINA LÚCIA
(No álbum dos seus dois anos)
Pintassilgos, logo cedo,
Pipilaram de arvoredo
No seu ninho de pelúcia,
Se desfazendo num canto,
Cem doçura e com encanto,
Saudade Regina Lúcia.
Disse Deus aos passarinhos,
Lá no refúgio dos ninhos,
Desvendando seus arcanos:
- Regina Lúcia, querida,
Que dos seus pais é a vida,
Completa hoje dois anos.
Vendo deus sua inocência,
Deixa sua Onipotência
- O seu Reino de Orandezas –
E, sem ninguém o notar,
Ajuda um anjo a apagar
Duas velinhas acesas.
Antídio de AZEVEDO.
13 – 07 – 1962
TROVAS
Eu creio que os pirilampos,
Na escuridão do pernoite,
São pequeninos relampos
Abrindo dentro da noite.
L. Bezerra
________________
Quero crer que os pirilampos
São pensamentos de luz;
São fagulhas de relampos
Lá do isqueiro de Jesus.
A. Azevedo
MOTTE:
Lá na Cabana do cego
Não se morre de calor.
GLOSA:
Quando ás treze me desprego
Da cidade p’ra Ribeira
Chego cheio de canceira
Lá na cabana do cego,
No copo bem cheio pego
E bebo a bom sabor,
Já deixando no armador
A rêde bem maciinha,
Pois, bebendo a “Cascatinha”,
Não se morre de calor.
Sydrack Luna
Antídio de Azevedo
4º cartório Judiciário
ESTUDO CRÍTICO
Antídio de Azevedo revisitado: Poesia e Memória
Autor: Fabrício Guto Macêdo de Souza
Resumo
O presente trabalho compreende a leitura da poesia do escritor Antídio de Azevedo. Sua produção literária, tornou-se conhecida entre seus conterrâneos pelas características do estilo regionalista. Destaca-se o caráter representativo do local, da raça e dos costumes, e de tudo o que se encaixa no campo histórico-geográfico da região onde esteve situado, o interior do Rio Grande do Norte, mais especificamente a Região do Seridó. Este intelectual objetivou trazer, em forma de poesia, os detalhes da vida humilde e interiorana dos homens e mulheres nordestinos, seridoenses que sofrem as agruras da natureza que os circunda, mas que, ambientados, mostram o amor por sua terra. Esse poeta não esteve sozinho no Seridó; com ele estava o amigo e poeta Laurentino Bezerra, de Parelhas, além de outros autores da região que, unidos, constituiam um grupo de intelectuais, leitores e formadores de opinião, influenciando seus contemporâneos. O poeta teve sua produção literária a partir da década de 20, estendendo-se à 60, mas só lança o livro Pirilampos em 1963, com os poemas “Pirilampos”, “Acácia”, “O Sino”, “O Centenário da Paróquia” objetos do nosso recorte, também publicados no jornal A Folha de Caicó em 1956.
Palavras-Chave:
Poesia Potiguar, Memória e Cultura
Introdução
Este trabalho tem como objetivo analisar poemas dos livros Pirilampos e Zelações, do poeta seridoense Antídio de Azevedo, assim como encaixá-lo no contexto regionalista, que é parte integrante num dos vários tópicos do Modernismo.
Depois do foco em analisar os dados obtidos, o trabalho se divide nos demais assuntos, que serão tratados no decorrer das explicações sobre sua biografia e obra: bem como a memória em foco que nos traz do passado as mais variadas lembranças, das pessoas que conheceu quando criança, dos lugares que visitou e viveu. E também serão tratadas as influências do Parnasianismo, Arcadismo, Simbolismo e ainda discutir uma contradição encontrada em alguns de seus poemas. Essa contradição se restringe ao Parnasianismo: as complicações de sua estrutura, tencionando levar a perfeição na construção estrutural dos poemas; e o Arcadismo que é a simplicidade como foco, encontrados em vários de seus sonetos, destacando como característica a singeleza que revela nos traços do sertanejo.
A poesia de Antídio de Azevedo, produzida na década de 30, encontra-se marcada pelas distinções do Regionalismo, o qual se desenvolvia no período nas demais regiões do país. A metodologia utilizada para desenvolver esta análise centra-se em estudos de textos teóricos referentes ao movimento regionalista dentro da literatura Brasileira, confrontando-os com os poemas do autor em questão.
Também é intenção deste trabalho apresentar dentro dessas obras resgatadas, as influências recebidas, o processo de produção e divulgação no período em que foram escritas, bem como a importância das mesmas e suas contribuições dentro do contexto atual no qual vivemos.
Além de todas essas análises, descrever, com base na presença de Graça Aranha (1925) na criação do Regionalismo e a Semana de Arte Moderna para destacar as poesias de Antídio de Azevedo nesse contexto. E ainda utilizar de informações sobre o Modernismo em 1930, segundo João Luiz Lafetá (2000), para descrever com mais detalhes a influências que o Modernismo trouxe para os poetas da década de 30, e entender como essas influências se passam na poesia de Antídio.
A questão sobre memória tratada num dos capítulos possui as idéias de Marilena Chauí e José Moura Gonçalves Filho, para melhor compreensão do que é a memória, e tratá-la como objeto para análise de alguns de seus poemas, que são apresentados a partir das lembranças passadas do poeta.
Uma Precisa Biografia
Antônio Antídio de Azevedo nasceu em Jardim do Seridó, no dia 13 de junho de 1887.
Foi alfabetizado pelo pai Horácio Olímpio Azevedo e pelo primo Felinto Ideofonso de Oliveira Azevedo. Estudou com o professor paraibano João de Souza Falcão mais tarde quando foi morar na cidade.
Pertenceu ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e também ao Paraibano, a Academia Potiguar de Letras, a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, aos 82 anos, e a Academia de Trovas do RN.
Trabalhou como agente de Rendas Federais, adjunto (assessor) do Promotor Público e suplente do procurador da República, as de Tabelião de notas e Escrivão Judicial, durante 19 anos em Jardim do Seridó.
Por volta de 1937, foi removido para Natal, exercendo atividade no 4º Cartório, chegando a se aposentar. Foi eleito “Prefeito Constitucional do Município” em 1952. E em 1954 afasta-se do cargo e assumi o Vice, Manoel Paulino dos S. Filho.
Faleceu em 1975, no dia 5 de novembro, sendo sepultado em Natal com 88 anos.
O livro Zelações foi publicado pelo departamento de Imprensa do Estado, com Prefácio do escritor Luiz da Câmara Cascudo (1º volume, 1955). E em 1963 publicou o segundo volume de versos, publica o livro Pirilampos no qual recebe elogios da crítica especializada.
Colaborou em diversos jornais e revistas do Estado e do país, escrevendo em prosa e verso.
Pertenceu ainda, ao Clube de Poesia de Natal, ao Teatro de Amadores de Natal, à União Brasileira de Escritores, na seção do Estado e à Academia Diocésia.
Em suas plaquetas, fez estudo sobre Olavo Bilac, importante poeta que influenciou Antídio em suas poesias com os sonetos decassílabos e alexandrinos metrificados.
Antídio de Azevedo fazia leituras de poesias dos grandes poetas Guerra Finaqueiro, Júlio Dantas e dos Brasileiros: Olavo Bilac, Guimarães Rosa, Emílio de Menezes, Alphonsus de Guimarães, Arthur de Azevedo (parente).
Antídio de Azevedo escreveu para o autor da revista O Malho, revista carioca dirigida pelo crítico e poeta Emílio de Mesezes, pois tinha interesse em publicar seus versos, mas com receio em relação a metrificação de seus poemas, resolveu não enviar. Depois o autor da revista o aconselhou a adquirir o livro Tratado de Versificação de O. Bilac e Guimarães Passos, e assim que teve noção das regras das métricas, Antídio envia e publica o soneto Juazeiro para a revista.
Colaborou para muitas revistas, almanaque e jornais do Brasil, Portugal e do Estado, notadamente na Vida Doméstica, (RJ); A Cooperação, Jornal de Felgueiras (Portugal); Almanaque de Bonito (PE); A União, Correio da Paraíba, Era Nova, Manaíra e Tambaú (J. Pessoa); O diário, A República, Folha da Tarde, Milho Verde e Nordeste Magazine (Natal); Correio do Seridó, O Seridoense e A Folha de Caicó, e Voz do Seridó (Currais Novos).
Em Jardim do Seridó fundou e dirigiu os jornais O Município com Heráclito Pires, fotógrafo do jornal; o Jornal da Festa, que circulava durante a festa da padroeira da cidade; e o Jornal O Parafuso¸ nesse, Antídio escrevia como anônimo, ele contava piadas e brincadeiras humorísticas.
No poema Homenagem a Jardim, Antídio de Azevedo faz referências a cidade Jardim do Seridó como uma cidade bela, cheia de encantos, paz, amor e demonstra seu sentimento de liberdade através da cidade que nasceu.
No poema “Minha Terra” (inédito), Antídio de Azevedo enfatiza o povo Jardinense, diz ter descendência de portugueses que fundaram a fazenda Conceição e Fogo, a famosa Jardim do Seridó, como a mais bonita do sertão.
Regionalismo e Semana de Arte Moderna
Foi a partir da Semana de Arte Moderna que a Literatura Brasileira passou a se ampliar em relação às diversas temáticas, criando-se um novo tópico dentro da mesma, o Regionalismo. Nesse contexto, os poetas que tratavam o caráter representativo de um local, uma raça e seus costumes e tudo o que se encaixa no campo histórico-geográfico da região, foram a partir dessa década tratados como poetas regionalistas.
Segundo Graça Aranha, em seu livro Espírito Moderno (1925):
[...] A Semana da Arte moderna foi um duplo vértice histórico; a convergência de idéias estéticas do passado, apuradas e substituídas pelas novas teorias européias (futurismo, expressionismo, cubismo, dadaísmo e espiritonovismo); e também ponto de partida para as conquistas expressionais da literatura brasileira neste século.
Pode-se dizer até que a Semana de Arte Moderna foi uma espécie de Gênese brasileiro, como se nunca existisse antes dela, nada de literário. E se chegou a existir, uma inversão da ordem de idéias de valores, a ruptura com o passado, podemos dizer que a essência cultural continuou sendo a mesma, só que mais enriquecida e dinamizada do que antes.
Desse modo, a Semana de Arte Moderna, deu uma grande contribuição para a revolução literária que se veio a consolidar na segunda fase do Modernismo. Resumindo, segundo Graça Aranha, a Semana de Arte Moderna foi importante em dois aspectos: ...abertura e dinamização dos elementos culturais, incentivando a pesquisa formal, vale dizer a linguagem; ampliação do ângulo óptico para os macro e microtemas da realidade nacional... (1925).
Depois da Semana de Arte Moderna, o Centro Regionalista (programa de 1926), instaurado no Nordeste e comandado por Gilberto Freire, em Pernambuco, foi quem desenvolveu o sentimento de unidade do Nordeste, pela rica condição histórico-geográfica, trabalhando nos interesses sócio-econômicos e culturais da região.
Então, o que se pode dizer com a Semana de Arte Moderna, é que, com a criação dela o Modernismo se consolidou, e dentro dessa área todos os poetas que tratavam de questões do caráter local e seus respectivos detalhes, algumas vezes questões de sentimento e de características das pessoas, foram também tratados como poetas universais. Deve-se lembrar também que, segundo João Luíz Lafetá (2000):
Os anos 30 foi uma década de politização onde se colocou em pauta um projeto ideológico preocupado com os problemas sociais. Nesse período, foram produzidos romances de denúncia, poesias militantes e de combate. No modernismo esta foi considerada a sua fase áurea, de maturidade e equilíbrio, em que o escritor tinha mais liberdade e segurança para criar, numa visão mais crítica, os problemas de realidade brasileira.
Percebe-se que haverá, não só descrições de regiões, ou de pessoas e suas respectivas culturas, mas algumas obras dessa época foram escritas também para outros fins, como o de críticas ao governo, sugestões para boas administrações políticas ou ainda de preocupação com a situação dos nordestinos frente aos problemas trazidos pela seca.
Estudo do poema “Os Retirantes”
Tristonhos, a sofrer a cruel impiedade
Do sol ardente, qual rubra fogueira acesa,
Se vão em caravana e sempre na incerteza
De que ampara-los venha a mão da Caricidade!
Despidos de ilusão, na dura realidade
Da vida, a palmilhar, cansados, a aspereza
Dos campos nus, sofrendo o agror da Natureza,
Vão eles a fugir do lar que a fome invade!
E pela estrada assim, pisando sobre abrolhos,
Enquanto se arrojando, inquietas, dos seus olhos,
As lágrimas se vão - num desfilar eterno –
Recordam, com saudade, o tempo em que nos ninhos,
Ouvia-se o cantar feliz dos passarinhos,
Nas matas do Sertão – no adeus claro do Inverno!
Esse poema é um soneto, assim como todas as outras poesias contidas no livro Zelações (1954: 79). O soneto foi a forma escolhida pelo autor para quase todas as suas produções. Sua afeição pelo soneto se segue por ser, segundo ele “Passadista conservador... fiel à musicalidade da métrica e á sonoridade cantante da rima...”.
Quanto ao poema, do ponto de vista histórico, os retirantes eram emigrantes nordestinos que fugiam da seca. Pois se o eu lírico trata de tal assunto, é por viver perto dessa gente que fez sua inspiração controlar seus dedos e escrever de forma poética uma de suas representações locais, trazendo-o a forma conhecida como Regionalismo, dedicando também as mais variadas manifestações literárias.
Na primeira estrofe do soneto “Os Retirantes”, o eu lírico destaca o sol ardente nordestino, tão descrito nas mais variadas produções de qualquer escritor da região, e tão divulgado nas palavras das pessoas que vivem lá. E de tão tristes que vão, os retirantes, sofrendo do opressivo sol ardente queimando sob suas cabeças. Os retirantes eram formados por famílias que perderam tudo com a seca, e seguem sempre em viagem, em caravana para onde houver chuva e terra para plantarem, ou para algum lugar que possam ser ajudados. E o eu lírico descreve bem essas características: “Se vão em caravana e sempre na incerteza”. Depois trata de que incerteza essas famílias sempre carregam, que é a de receber uma “caridade” de qualquer um indivíduo que possa ajudar com um pedaço de pão, um pouco de água, ou até um lugar para ficar enquanto não resolvem para onde deverão ir.
Nota-se que a palavra final da estrofe, “Caricidade” está marcado no início com letra maiúscula. Isso é um traço do Simbolismo, e que foi bem colocado. Serve para dar ênfase a palavra, nesse caso “Caricidade”, ou caridade, visto como, precisamente, o que os retirantes precisavam sempre que saíam em caravana, o amor que move a vontade efetiva do bem do outro, a beneficência que sempre precisavam quando estavam sofrendo da “cruel impiedade do sol ardente”.
Na segunda estrofe o eu lírico continua descrevendo o sofrimento dessas famílias que andavam vestidas de farrapos e comiam palma, ou farinha seca. Tendo apenas um ao outro, os retirantes não tem mesmo nem a ilusão, que movem as pessoas para o futuro. É a ilusão que faz as pessoas formarem um futuro para elas, não aquela ilusão que é uma mentira, mas uma ilusão que poderia se transformar em realidade se corrigido diariamente. Mas quanto aos retirantes, eles não tinham ilusão, eram “despidos”, e viviam sofrendo da “dura realidade da vida”, que eles estavam passando, vendo-se quase sempre à beira da morte por inanição e cansados, observando os campos vazios, queimados pelo sol ardente do sertão nordestino, ou melhor, “sofrendo o agror da Natureza.
Dessa vez o eu lírico deu ênfase a palavra Natureza, visto na terceira linha da segunda estrofe. Não a natureza em seu contexto geral, mas a natureza como ela é no sertão nordestino: impiedosa, que castiga, e faz de qualquer ser humano um “zumbi”, procurando por alimento por onde quer que passe.
Na terceira estrofe, os retirantes continuam sempre andando, pela estrada, pisando sobre as pedras que há no caminho. No ponto de vista ambíguo da palavra, os retirantes tanto pisavam em pedras quando estavam andando nas estradas, quanto sempre haviam “pedras em seus caminhos”, ou problemas em suas vidas, como a falta de chuvas que faleciam seus campos, mas que nunca desistiam, seguiam em frente à procura incessante por sobreviver.
Seguindo na mesma estrofe o eu lírico descreve a marcha dos retirantes como “lágrimas que se vão”. Neste caso, podemos imaginar quando uma pessoa está extremamente triste, e por conseguinte, chora, logo essas lágrimas sairão de seus olhos e irão percorrer um caminho pela face do rosto triste, “num desfilar eterno”, que são as curvas que o “rio” de lágrimas produz. Os retirantes são lágrimas porque são tristes, sem lar, sem comida, água ou vestimenta. E quando choram, quando saem de suas vidas, de suas casas, seguem em marcha e sem destino nas curvas das estradas de barro, ou da vida.
A última estrofe, o eu lírico descreve o que se passa na memória dos retirantes: “Recordam, com saudade, o tempo em que nos ninhos,/ Ouvia-se o cantar feliz dos passarinhos”. São as recordações dessas famílias retirantes quando viviam suas vidas humanas, não essa de animais que vivem só de andar a procura de restos de comida. Mas sempre lembram quando viviam em suas casas e observavam seus filhos cantando e brincando felizes com a vida rica que tinham. E viviam nos campos entre as matas do sertão.
A última linha o eu lírico destaca, como ferramenta do simbolismo, “Sertão”, lugar do nordeste que produz essa gente forte, de cultura inigualável, e uma beleza de natureza que faria qualquer visitante se encantar, e “Inverno”, estação mais cobiçada dos nordestinos. O inverno é a estação que produz chuva e deixa as pessoas do sertão ricas em recursos naturais. E quando o eu lírico descreve as lembranças dos retirantes, o encanto é quebrado quando se lembram do último adeus do inverno, de quando as chuvas cessaram e não se passou muito tempo até que a terra ficou muito seca, sem recursos para plantar e obter daí o sustento de toda a família, sendo obrigados a cair na estrada como retirantes.
No ponto de vista geral do poema, compreende-se a simplicidade na maioria das palavras do soneto, e essa simplicidade, como característica do Arcadismo, também pode ser comparada com a simplicidade que as pessoas dessa região carregam. A simplicidade em seus trabalhos, na sua linguagem, e principalmente a simplicidade que é a caridade ao próximo.
O poema também não só é dado como regional, só por fazer parte de um poeta do Regionalismo, ou escrito com informações de uma determinada região. É visto também como universal, por tratar dos sentimentos e dores das pessoas, já que o sentimento é uma diversidade que todas as pessoas carregam, trata-se também como um poema universal.
Uma Visão do Passado
Um dos temas observados em alguns poemas de Antídio foi o de relembrar os velhos tempos da mocidade e os problemas que já superou e as experiências existidas em cada degrau de sua vida de poeta, e os lugares ou pessoas que conheceu antes e que agora não existem mais em sua vida.
Na memória de um velho poeta guardam tantas lembranças quanto uma biblioteca guarda a sabedoria de tantos livros, com isso, Antídio vai escrever em alguns de seus poemas as imagens que se passam em sua lembrança como uma forma de conter essas suas (in) felicidades em palavras que formam uma poética de grande porte para um escritor que não foi tão ensinado nas artes da poesia.
Para Marilena Chauí (2002: 125):
A memória é uma evocação do passado. É a capacidade humana para reter e guardar o tempo que se foi, salvando-o da perda total. A lembrança conserva aquilo que se foi e não retornará jamais. É nossa primeira e mais fundamental experiência do tempo e uma das obras mais significativas da literatura universal contemporânea [...]
Ressalte que Marilena Chauí é direta no início da citação quando diz “A memória é uma evocação do passado”, pois objetiva o que Antídio vai relatar nessas poesias de ampla riqueza artística.
Num poema chamado “Velhos Caminhos” o Eu lírico descreve desapontado o desejo de passar por um caminho que já andou quando era chovem, pois ele o deixa com uma grande saudade, aquela saudade triste de “ver” o passado na sua frente sem poder retorná-lo. Ele é bem singular ao descrever:
Não posso percorrer estes caminhos,
Por onde tanto andei na mocidade,
Sem a ferida aberta dos espinhos
Que vem deixar a seta da saudade!...
Mesmo evitando os velhos caminhos por onde tanto passou, o eu lírico ainda recorda das aventuras que decorreu, mas por causa de sua idade ele revela uma verdade de nunca mais poder repeti-la: “Recordo, agora, o mundo de loucuras/ Dos dias que se foram, de aventuras/ Que nunca mais terei na minha vida!”.
Suas recordações, desse “mundo de loucuras” são uma atualização, na sua memória, do passado e também, como diz Marilena Chauí: um “registro do presente para que permaneça como lembrança”.
Guardamos na memória aquilo que possui maior significação para nossas vidas, no caso do eu lírico no poema Velhos Caminhos, as aventuras que passou naquele lugar, uma lembrança para ele, mesmo que apenas um momento curto que jamais se repetirá, e que agora quer desejar não passar mais, por pretensão de evitar a saudade.
José Moura Gonçalvez Filho (1988: 99) descreve a memória como os traços do eu no descrever de seu passado:
A memória oferece o passado através de um modo de ver o passado:
exercício de congenialidade, onde há, pois, investimentos do sujeito recordação já não podemos mais dissociá-los: então fará tanto sentido entender o sujeito a partir do que recordou quanto o que recordou a partir do modo como o fez. A recordação traz a marca dos padrões e valores mais ou menos ideológicos do sujeito, a marca dos seus sentimentos, a colorir eticamente e afetivamente a lembrança, traz a marca de sua inteligência, a encontrar razões do passado – e a recordação traz, ao mesmo tempo, as determinações do passado na urdidura daqueles padrões, daqueles valores, daqueles sentimentos, daquela inteligência.
A memória faz o indivíduo viajar ao passado e cruzar a história e a intimidade, criando histórias do sujeito na família, na escola, no trabalho, no bairro ou na cidade, em todo grupo que o indivíduo se nutre de alegrias ou de tristezas, e que constroem através dessas lembranças sua identidade.
Quanto a sua escrita na poesia em função da memória, Antídio traz sua marca gravada na lembrança, as felicidades que existiu quando criança. Ele traz a marca de seus sentimentos ao relembrar os agrados que teve na mocidade: “Os dias transbordantes de afeições/ Da mocidade alegre e prazenteira”. Essa razão de Antídio lembrar o passado não só o identifica como feliz quando criança, mas também como ficar feliz ao lembrar de tempos alegres, ao mesmo tempo que fica triste ao lembrar que esse tempo não pode se repetir.
Quando adolescente, o eu lírico expõe o quanto foi “vibrante”, normal de todo adolescente, mas para ele, não quis deixar de relembrar e descrever para que se torne presente uma época de felizes instantes quando adolescente:
Um rastro de fagueiras libações
Dos felizes instantes da fogueira
Crepitantes, de imensas vibrações,
Da minha adolescência passageira.
São “instantes”, apenas alguns pontos curtos da memória, os mais significativos e de maior impacto da vida do eu lírico. Ele não descreve o que aconteceu, mas lembra como foi que aconteceu sua juventude. Se forem apenas instantes, mas que são significativos, se forem vibrações, pois a adolescência é a fase mais agitada da vida da maioria das pessoas, o que prova que o eu lírico foi uma dessas pessoas. Quando ele usa o termo “fogueiras crepitantes” para esses “felizes instantes” de sua adolescência, está provado que o eu lírico teve uma adolescência cheia de grados. Claro que existe os desagrados, mas ele não descreve, que mostra ser também uma marca de sua identidade: descrever os instantes da memória apenas os momentos bons, sem desagrados, mas que deixam uma profunda saudade do passado.
Em outro poema de Antídio, chamado “Tapera” do livro Zelações (1954: 117), o eu lírico descreve um local de tal forma que Marilena Chauí descreve esse tipo de memória como “memória-fluxo-de-duração-pessoal”, visto que através dela: “Que nos faz guardar a lembrança de coisas, fatos, pessoas, lugares cujo significado é importante para nós, seja do ponto de vista de nossos conhecimentos”. O eu lírico mostra significado quando relembra um lugar de grande felicidade: “Escombros de ancestral felicidade / de um casal de velhinhos”, mas agora um período que se foi por conseqüência do tempo que tudo transforma em pó, mas que existe a memória de alguém para salvar e transformar esses “escombros” no mesmo momento de antes.
Ao deixar de recordar o momento que esse lugar era “vivo”, seus olhos voltam ao presente e revelam o quão devastado está esse lugar, em obra do tempo: “parece que visito um cemitério!”. Enquanto passa o olhar no lugar varrido pelo tempo, o eu lírico conta o que sente ao lembrar o passado e aquele casal de velhinhos, felizes, “abraçados e juntinhos”: “Sinto o meu ser e o coração feridos, / Mas... não sei desvendar esse mistério!....” Vê-se duas reticências na última estrofe, a primeira depois da palavra “mas...”, usada para caracterizar como se o eu lírico estivesse pensado o que vai falar em seguida, mesmo assim não encontra resposta para tal sentimento, e encerra a estrofe sem saber o mistério que provoca tal sentimento e em seguida com mais uma reticência, pois poderia ser deixado a resposta a critério do leitor, mas como o tema “memória” esta sendo analisado nesse poema, está claro que o eu lírico está sentindo aflição de existir em suas lembranças, um momento como aquele de felicidade de uma casal de velhinhos, mas que agora só resta escombros.
Conclusão
Deve-se lembrar que Antídio revela uma contradição em seus poemas: o conteúdo Modernista-Regionalista, produzido numa estética recebida do Parnasianismo, influencia de Olavo Bilac, além do apego ao Arcadismo, pois há uma riqueza de simplicidade em suas poesias, como característica das pessoas que descreve. E, declara Bilac como seu companheiro nas formas dos poemas: “...mesmo afago e amor ao ritmo, dentro dos rigores da métrica, que é a música do verso e da sonoridade da rima”. Mas ele só encontrará sua verdadeira forma quando realmente juntar as duas forma literárias. Antídio acredita que a perfeição da poesia deveria está de dentro a fora dela, do conteúdo a estética, então ele constrói seus poemas num tema modernista/regionalista construído numa forma parnasiana. E finalmente ele acha a perfeição, coletou uma característica em destaque de um e completou com a do outro, tornando-as uma só. Duas perfeições em uma só construção, isso é o que Antídio chama de poesia.
A análise de alguns de seus poemas no contexto sobre memória, traduz-nos a importância de trazer as lembranças do passado, tanto boas como tristes, de volta ao presente e torna-las imunes ao desgastante tempo. Esse tempo torna uma palavra em pó, mas que possa ser lembrada e então salva para que seja eternamente vista e lida pelos leitores do presente e do futuro que virá, e capacite nas lembranças dos outros, um dos maiores poetas que, no seridó Norte-Rio-Grandese, existiu.
Quanto ao trabalho em si, este foi responsável por descrever boa parte dos resultados obtidos por parte de uma pesquisa, que há anos perdura obtendo dados de poetas esquecidos da Região Seridoense, e fez com que fossem encontrados bastantes detalhes que serão analisados em trabalhos paralelos a esse, com o estudo de outros poemas.
Bibliografia
ARANHA, Graça. Espírito Moderno. São Paulo: Monteiro Lobato, 1925.
AZEVEDO, Antídio de. Zelações. Natal: Academia Potiguar de Letras, 1954.
___________________. Pirilampos. Natal: Academia Potiguar de Letras, 1963.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2002.
FREYRE, Gilberto. Manifesto Regionalista de 1926. Rio de Janeiro: M.E.C., 1955.
LAFETÁ, João Luíz. 1930: A Crítica e o Modernismo. São Paulo: Duas Cidades, 2000.
Novaes, Adauto (org.). O Olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
OBS: Artigo publicado no 1º SEHEL - Seminário de História do Ensino das Línguas (Aracajú-SE)
https://www.sehel2009.com.br/app/Comunicacoes_Orais/Eixo_II_HISTORIA_E%20HISTORIOGRAFIA_LITERARIA/pdf/Fabricio_Guto_Macedo_de_Souza.pdf